Adesão do HU à Ebserh é novamente discutida na UFSC

Ebserh administra Hospital Universitário há oito anos. TAEs reivindicam que UFSC não renove contrato com a empresa em 2026

CAMILA BORGES

Jornadas de trabalho com equipes reduzidas, assédio moral, falta de medicamentos e ausência de utensílios como máscaras. Esses são alguns dos problemas apontados por Matrede Oliveira, enfermeira pediátrica no Hospital Universitário Professor Polydoro Ernani de São Thiago (HU), durante debate sobre processo de adesão do hospital à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh). 

O evento foi organizado pelo Diretório Central dos Estudantes Luís Travassos (DCE) e ocorreu na quarta-feira (10) no auditório do Centro de Ciências Econômicas (CSE) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em Florianópolis.

A Ebserh é uma empresa pública de direito privado vinculada ao Ministério da Educação e Cultura (MEC) que administra 45 dos 51 hospitais universitários brasileiros. A empresa foi criada em 2011 com a proposta de modernizar os hospitais universitários e administra o HU-UFSC desde 2016. 

Em 2015, foi realizado um plebiscito na UFSC como forma de consulta pública em que 70% da comunidade universitária se posicionou contra a adesão do HU à Ebserh. No total de 8.731 votos, 6.168 (70,59%) foram contrários e 2.548 (29,18%) foram favoráveis, com 15 votos em branco (0,23%).  


Apesar do plebiscito, o Conselho Universitário optou pela filiação do HU à empresa. “A votação do CUn foi autoritária e antidemocrática”, afirmou a assistente social Bruna Veiga, que estagiou no HU em 2013 e participou da mobilização contra a Ebserh.


O parecer escrito pelo conselheiro e professor do Departamento de Jornalismo Carlos Locatelli, favorável à adesão do HU à Ebserh, foi votado no quartel da Polícia Militar (PM) no bairro Trindade, em Florianópolis, após a primeira tentativa de votação ter sido barrada pela mobilização estudantil. Na época, 37 dos 67 conselheiros universitários participaram da consulta na PM. Destes, 35 se posicionaram favoráveis à adesão.

Hospital Universitário da UFSC é administrado pela Ebserh desde 2016. Foto: Agecom UFSC

Antes, a administração do HU era responsabilidade da UFSC que recebia junto ao orçamento uma quantia para destinar ao hospital. Com a adesão do HU à Ebserh, verbas do MEC e do Sistema Único de Saúde (SUS) passaram a ser encaminhadas diretamente à empresa. O responsável pela administração orçamentária do HU-UFSC, Nélio Schmitt, foi questionado sobre os valores repassados a Ebserh. Até a publicação desta reportagem, Nélio não respondeu ao Fatual.

A renovação do contrato da UFSC com a Ebserh está prevista para 2026. Uma das principais pautas defendidas pelos funcionários do HU contratados pela UFSC – que representam cerca de 40% do atual quadro de trabalhadores do hospital – durante a greve dos Técnicos-Administrativos em Educação (TAEs) foi a não renovação do contrato com a empresa. Na reunião com os TAEs em 1º de junho, o reitor Irineu Manoel de Souza se manifestou favorável às reivindicações dos servidores. “Estamos no trabalho de resgatar o HU”.

Paulo Machado, professor de História na UFSC e relator de um parecer no CUn contrário à Ebserh, afirma que a empresa compromete a realização de ensino, pesquisa e extensão no HU. “A Ebserh tem uma administração central em Brasília que torna tudo distante. O objetivo original dos HU’s de serem hospitais-escolas é prejudicado. As universidades perderam a autonomia para decidir sobre a administração das verbas em seus hospitais. Agora, ficamos reféns de uma direção central, distante e massificada”, explicou.

De acordo com Bruna Veiga, as verbas públicas são geridas pela empresa a partir da perspectiva neoliberal. “A Ebserh preza por números. Pela quantidade de atendimentos e não pela qualidade. Isso é prejudicial à proposta de hospital-escola e coloca em xeque a excelência dos serviços oferecidos”, disse.

Matrede Oliveira, que é enfermeira no HU há 26 anos, afirmou que após a entrada da Ebserh no hospital, casos de assédio e abuso de autoridade são frequentes. Segundo a enfermeira, anteriormente à adesão, os cargos de chefia eram escolhidos de maneira democrática. “Na administração da Ebserh as escolhas são feitas por ‘QI’, ou seja, quem indica”.

Estudantes da UFSC que estagiam no HU dizem que não se sentem acolhidos no local. “Deveríamos entrar no hospital que é nossa casa. Mas muitos funcionários da Ebserh que supervisionam os estágios nos tratam como um peso. Eles esqueceram que estão em um hospital-escola”, relatou um estudante da 9ª fase de Medicina que preferiu não ser identificado.


“Antes podíamos protestar do outro lado da rua, indo até a reitoria. Agora vamos reclamar para quem? Tudo ficou distante”, completou.


“Os nossos estágios são muito importantes. Entendemos que o HU é um hospital de excelência, mas, desde a entrada da Ebserh, ocorreu uma mudança no caráter de hospital-escola. Os estagiários lidam com muito assédio moral, com muita resistência de alguns profissionais. Acontecem rotineiramente maus tratos contra os universitários”, afirma uma estudante da 10ª fase do curso de Farmácia.

O HU-UFSC realiza cerca de 16 mil consultas mensais e uma média de mil internações por mês. Pacientes de todo o estado de Santa Catarina são encaminhados  ao HU, por meio do SUS. No primeiro semestre de 2024, 589 alunos da UFSC fizeram estágio obrigatório no local.

A administração do HU foi questionada sobre os problemas apontados, mas o Fatual não obteve resposta até a publicação desta reportagem. 

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